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Mulheres precisam de cotas no trabalho? 5 executivas de sucesso respondem

Sim! Mesmo que temporariamente, essa é uma das saídas apontadas por diversas líderes para aumentar a presença feminina nos altos cargos das empresas. Veja o que as defensoras da medida têm a dizer

Por Liliane Prata
Atualizado em 31 out 2016, 11h31 - Publicado em 26 ago 2015, 12h53

Quando se fala em obrigar empresas ou universidades a destinar uma porcentagem de vagas para mulheres, negros ou qualquer outro grupo, muitos torcem o nariz, alegando que a medida é discriminatória. “Esses críticos estão certos”, diz Renata Fagundes, que faz parte do Grupo Assessor da Sociedade Civil da ONU Mulheres (rede ligada à Organização das Nações Unidas) e, como as outras entrevistadas nesta matéria, é a favor das cotas femininas. “Mas nem toda discriminação é negativa. Quando você adota um tratamento diferente para idosos ou rampas para deficientes, está contribuindo para a inclusão daquele setor.”

Mas, se estamos no século 21 e as mulheres já foram inseridas no mercado de trabalho, por que seria necessária uma medida tão impositiva? Segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV) conduzido pela pesquisadora Ligia Paula Pires Pinto Sica, a proporção de mulheres nos cargos de alta administração das companhias de capital aberto brasileiras é de 8%. O problema não é exclusivo do nosso país. Foi por ter números parecidos nas diretorias das empresas que Dinamarca, Alemanha e Espanha aderiram às cotas. De acordo com a consultoria McKinsey, os conselhos administrativos da América Latina têm, em média, 5% de mulheres, bem menos que os europeus (17%). Irene Natividad, presidente da Cúpula Global das Mulheres, aponta alguns países da Europa como exemplo do sucesso da estratégia: a França, que aderiu às cotas em 2011, agora tem 30% de executivas nas mesas de decisões – acima, portanto, da média do continente.

E o que, afinal, dificulta a ascensão feminina? “A sociedade impõe padrões diferentes para meninos e meninas”, diz Ligia. “Somos desencorajadas a competir e a liderar”, afirma Luiza Helena Trajano, presidente do Magazine Luiza e líder da sociedade sem fins lucrativos Mulheres do Brasil, que está preparando um projeto de lei sobre cotas para mulher (com porcentagem a ser definida) e planeja apresentá-lo à presidente Dilma Rousseff. Nossa dupla jornada entra nesse pacote de barreiras tradicionais. Segundo dados de 2014 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as brasileiras de 15 a 29 anos dedicam 20 horas por semana às tarefas domésticas, enquanto entre eles esse número cai para menos da metade: nove. “Se o filho tem febre ou um problema na escola, quem é cobrada geralmente é a mãe, mesmo que trabalhe tanto ou mais que o pai”, lembra Renata. “O componente cultural é nosso principal desafio e não se restringe ao mercado”, analisa a pesquisadora.

O modelo atual do mundo corporativo já não é meritocrático

Mérito à prova

“Fui beneficiada pelas cotas ao trabalhar em uma multinacional holandesa que adotava a medida. Durante reuniões importantes, eu percebia que era observada com microscópio por ter de alguma forma tirado vantagem da regra na minha contratação. Só que a cota dá a oportunidade, mas, para se manter no posto, você precisa ter competência ou será demitida como qualquer um. Brinco fazendo um paralelo com um campeonato de futebol: com elas, ganhamos acesso à série A, mas precisamos jogar bem para não sermos rebaixadas de novo. Há quem diga que esse sistema atropela a meritocracia; no entanto, o modelo atual do mundo corporativo já não é meritocrático. Existe, no topo, uma cota implícita de 92% para os homens. Na base, você encontra equilíbrio entre os gêneros. À medida que sobe na pirâmide, porém, a diferença vai aumentando e, lá em cima, há só 8% de mulheres. Por que isso acontece? Homens (sejam executivos ou headhunters) estão habituados a contratar homens. Não é uma questão de mérito, mas um sistema que mistura nos conselhos bons executivos, que chegaram lá por competência, aos nem tão bons, que estão ali por causa do gênero.”

Alessandra Ginante, vice-presidente de recursos humanos da Avon

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Processo transitório

“Ainda existe uma premissa de que a mulher não dá conta de cargos de diretoria. E, muitas vezes, são elas próprias que não investem na carreira ou por não se acharem boas o suficiente ou por sentirem culpa de não ficar muito com os filhos. Ainda somos criadas para nos realizar no ambiente doméstico (ser mãe, boa esposa, cuidar da casa) e crescemos com pouca autoconfiança para liderar. Por outro lado, as que querem investir no trabalho não encontram muitas oportunidades de ascender. Os colegas homens vão sendo promovidos e elas não. As cotas são um processo transitório para acertar essa desigualdade de gêneros no ambiente profissional. Depois, quando houver um equilíbrio maior nas empresas, a medida não será mais necessária e caminharemos sozinhas. Sem as cotas, vamos demorar muito para chegar ao ponto ideal.”

Luiza Helena Trajano, presidente da rede de lojas Magazine Luiza

Não há um único país no mundo que tenha vencido a diferença salarial entre homens e mulheres no mesmo emprego

Salários menores

“Não há um único país no mundo que tenha vencido a diferença salarial entre homens e mulheres no mesmo emprego: ainda ganhamos menos que eles. Em muitas nações, como o Brasil, temos equidade no número de alunos nas escolas e faculdades, mas o mesmo não se reflete nas empresas. Por quê? Não é por nossa culpa que temos dificuldades para chegar aos cargos de liderança. Isso acontece porque o mercado é comandado por homens que privilegiam homens. E o que fazer? Os países que adotaram cotas estão colhendo ótimos resultados: basta olhar para as experiências norueguesa, finlandesa… Na Noruega, a porcentagem de diretoras pulou para 35%. É urgente pensarmos nas próximas gerações. As meninas precisam crescer vendo mulheres no comando. Só assim a lógica vai mudar. Somos 50% do mundo. Estabelecer cotas é oferecer às mulheres as mesmas oportunidades dos homens, que são os outros 50% da população.”

Irene Natividad, presidente da Cúpula Global das Mulheres

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Há machismo e um preconceito em relação não só à maternidade mas a uma suposta fragilidade feminina

Mudança cultural

“Se transformar a cultura é o nosso principal desafio, qual é o papel das empresas nisso? Justamente colocar em pauta essas discussões. Nos últimos anos, as corporações foram chamadas a cumprir seu papel social e tivemos avanços no sentido de incorporar a temática da diversidade no cotidiano profissional. A empresa não é deliberadamente machista, mas um reflexo da nossa cultura – e vice-versa. Ela não assume conscientemente as ações de exclusão, assim como não coloca na agenda, por exemplo, a necessidade de contratar pessoas com deficiência se não for obrigada. Precisamos pensar em novas estruturas e procedimentos. A lógica estruturante da nossa sociedade é excludente em termos de gênero, de classe social… E isso se reflete nas organizações. Sem um empurrão, as empresas não vão mudar. É necessário revisar os critérios de ascensão profissional para que se tornem mais equilibrados. As cotas são um bom exemplo de ação afirmativa nesse sentido.”
 
Renata Fagundes, integrante do Grupo Nacional Assessor da Sociedade Civil da ONU Mulheres

Filhos e família

“Muitas mulheres, quando chegam aos cargos de gerência, estão começando a pensar em engravidar. E, culturalmente, o zelo com as crianças ainda fica nas costas da mãe, mesmo que ela conte com a ajuda de uma babá. Isso não é saudável para ninguém: um pai que não leva o próprio filho ao médico vivencia a paternidade de forma rasa. O problema para a executiva não é ter crianças em casa, mas justamente o desequilíbrio na divisão dos cuidados com elas – e isso precisa ser alterado. Só que, mesmo com esse cenário adverso, nem todas abandonam o barco corporativo por causa da família. Portanto, há outros motivos envolvidos no fato de termos poucas mulheres nos altos cargos. Há machismo e um preconceito em relação não só à maternidade mas a uma suposta fragilidade feminina. O universo corporativo, feito por homens e para homens, é o reflexo mais evidente da sociedade patriarcal.”

Ligia Paula Pires Pinto Sica, coordenadora do Grupo de Pesquisas em Direito e Gênero da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo

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