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Karol Conka fala sobre racismo, empoderamento da mulher negra e machismo no rap nacional

Karol Conka fala sobre racismo, empoderamento da mulher negra e machismo dentro do rap nacional

Por Ana Júlia Gennari (colaboradora)
Atualizado em 21 jan 2020, 13h27 - Publicado em 12 mar 2016, 05h00

“Se quer falar comigo, então fala direito, fala direito!”, canta Karol Conka em Tombei, música que a consagrou como uma das rappers brasileiras mais influentes e que transmite 100% da personalidade marcante dela.

Karoline de Freitas Oliveira tem 29 anos e nasceu em Curitiba. A paranaense veio de uma família sem nenhuma ligação com a música. No entanto, sua mãe – seu grande exemplo de mulher e feminista – escrevia poesias e inspirou Conka a escrever desde criança.

Em 2014 Karol Conka estourou com o single citado acima, em parceria com Tropikillaz e se fez ouvir em todas as baladas ao redor do Brasil. Ela vem colecionando grandes hits em parcerias não só com Tropikillaz, mas também com Projota e Boss in Drama.

A cantora se tornou um símbolo de resistência para as mulheres negras. Conka não apenas canta, mas se posiciona politicamente em busca do empoderamento de mulheres negras e da importância do amor próprio e autoestima.

Em entrevista ela fala sobre as dificuldades que passou dentro do rap por ser mulher, assédio e abusos. E claro: feminismo, racismo e novos projetos.

Moving Stone
Moving Stone ()

Nas músicas “Você não vai”, “Que delícia”, “Tombei”, “Me Garanto” e outras, você fala muito sobre empoderamento da mulher negra. O que você pensa sobre essa questão?

Karol Conka: É muito importante ter esse tipo de música porque existem muitas meninas frustradas precisando de uma palavra de conforto. E a mídia e a sociedade reforçam esse padrão e criam pessoas frustradas. Eu já passei por isso. Quando eu era mais nova, me sentia muito mal por ser diferente. Por isso, resolvi escrever músicas que ajudassem outras meninas que sentiam a mesma coisa que eu. Acredito que quando a gente ouve uma música com palavra de conforto, de alguém que te entende, a gente pode se sentir melhor.

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Você sentiu alguma dificuldade na sua trajetória como cantora? O fato de escolher o rap, ser mulher e negra afetou em algo?

Olha, dificuldade sempre tem.. Eu passei algumas, mas eu acho que tive uma espécie de sorte porque era pra eu ter passado por coisa pior. No rap o problema não é ser negra, porque ele faz parte da cultura negra e tem uma raiz negra muito forte. O que torna difícil é ser mulher, é receber respeito sendo mulher. A gente só consegue respeito quando fala grosso, fala alto e faz um trabalho melhor do que os caras. Hoje eu entendo muito mais sobre o “negócio” que é o rap do que muitos homens. Só que precisei me esforçar duas vezes mais pra ser reconhecida.

Você se considera feminista?

Hoje eu me considero feminista, sim. Quando a gente tem informação, a gente consegue ver que toda mulher que entende o que é o feminismo gostaria de ser feminista. Quando eu era mais jovem eu enxergava o feminismo como um bicho de sete cabeças, não entendia muito bem. Depois de muitas fãs comentaram que eu era feminista, que minhas letras falavam do feminismo de alguma forma, eu fui atrás de saber o que era e percebi que eu já era tudo aquilo que estava lendo.

Foi depois de ganhar um prêmio em um concurso musical de sua escola, aos 16 anos, que Karol decidiu ocupar o espaço de um palco e soltar sua voz profissionalmente.

O que o feminismo representa pra você?

Meus maiores exemplos de feministas são minha mãe e minha vó, duas mulheres muito fortes. Minha vó apanhou muito do meu avô, conseguiu sair viva disso e se fortalecer para colocar um fim nessa violência. Ela me ensinou a nunca abaixar a cabeça pra homem nenhum e ficar esperando porque eles querem sempre levar vantagem em tudo. Além de ser libertador, o feminismo serve para buscar mudanças que precisam ser feitas na sociedade. Ele é essencial para formação das crianças, deveria ser ensinado na escola, tinha que estar nos livros que são lidos nas salas de aula.

A carreira de rapper começou pra valer a partir de 2002, quando Conka gravou um vídeo para a MTV, que circularia exclusivamente na internet. Nos anos seguintes, ela chegou a lançar algumas músicas no MySpace como Me GarantoMarias e Boa Festa. Mas foi em 2011 lançou seu primeiro single oficial Boa Noite, que também compõe seu primeiro álbum Batuk Freak, lançado em 2013, com hits maravilhosos, tais quais “Gandaia” e “Que Delícia”.

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Na música Gueto ao Luxo você fala da sua experiência pessoal. Como você sentiu essa mudança na sua vida, com o sucesso no rap, e a relação com seus amigos e família?

Continuo mantendo amizades que eu tenho desde que eu meus 5, 6 anos de idade. Minha relação com a família é tranquila e não mudou em nada. Eu fico menos tempo em Curitiba, mas quando vou, procuro passar um tempo com meus pais.

O modo como o machismo e racismo te afetam mudou depois que você ficou famosa?

Hoje, quando eu falo quem sou a coisa muda um pouco de figura. Por exemplo, recentemente, a polícia parou a minha equipe — com todos negros — no aeroporto de Macapá (AP). Para mim, claramente foi um ato de racismo. Umas 15, 20 pessoas brancas passaram direto, sem que eles as parassem. Não eram “pessoas suspeitas”. Quando eu falei que iria chamar meu advogado, que aquela situação era um abuso de autoridade, que eu era a Karol Conka e iria fazer um show na cidade, eles pararam na hora. Tive diversos problemas com contratantes também e não deixei por menos. E eu faço isso porque sei que sou a linha de frente do rap nacional feminino no Brasil. Eu me sinto na responsabilidade de abrir o caminho para as próximas meninas.

Quais tipos de problemas com contratantes?

Assédio, por exemplo. Uma vez um cara que contratou meu show achou que isso lhe dava o direito de ter uma noite de sexo comigo. Me disse que se não fosse pelo dinheiro dele eu não estaria ali. E não é assédio só dos caras que me contratam, mas também dos que estão assistindo aos shows. A real é que os homens sempre acham que você está ali como objeto sexual deles. Ano passado eu fiz um show no bairro da Barra do Rio de Janeiro, para um público mais de elite, e um cara que estava na frente do palco ficou me falando um monte de bosta. Ele ficava mostrando o dedo do meio e dizendo que iria introduzi-lo em mim. Quando acontecem essas coisas eu paro o show na hora, faço um discurso expondo o que tá rolando e expulso o cara da festa… Mesmo que a a festa seja dele, ou ele sai ou eu.

Moving Stone
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Como você se inspira para escrever as letras das músicas?

Eu me inspiro todo dia em alguma coisa. Alguma coisa do meu cotidiano, da minha vida. Eu vou escrever uma música com uma parceira mina muito foda que vai falar sobre feminismo. Mas ainda não posso adiantar nada (risos).

Quais são seus próximos projetos e quando sai o novo álbum?

Eu acabei de gravar uma música para o Lollapalooza junto com o Tropikillaz. Eles também vão produzir meu novo CD, que vai ter um monte de parcerias bacanas, mas são surpresa. O álbum novo sai em final de maio ou começo de junho, mas ainda não tenho nome… Isso é a última coisa que eu penso.

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Como é a sua relação com rappers famosos como Criolo e Emicida?

Fantástica. O Criolo é meu “buda”, ele sempre me fala coisas maravilhosas quando nos encontramos que eu levo comigo pra vida. O Emicida é meu parceiro de muitos anos, ele foi uma das pessoas que mais me incentivou. Eu tinha muito medo e ele disse: “você pode estar ali lado a lado lutando com as minas”. Foi um empurrão muito importante. O Rael também é meu brother. Tenho uma relação boa com todos.

Você tem algum recado para dar neste Dia da Mulher?

Eu gostaria que as pessoas tivessem mais empatia umas pelas outras. Quando uma mulher negra estiver lutando por uma causa, se as pessoas colocarem a empatia na frente, vão conseguir entender por que ela está ali. Hoje, a mulher está pedindo mais espaço e mais igualdade. Há uma necessidade disso, e as pessoas precisam ouvir. A real é que não é “mimimi”, estamos passando por um momento de reeducação social muito importante.

 

Essa matéria foi originalmente publicada no HuffPost Brasil.

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