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Danuza Leão fala sobre como a modernidade afetou a gastronomia e sua cultura

Nossa colunista conta suas experiências e compara as mudanças na gastronomia moderna.

Por Danuza Leão (colunista)
Atualizado em 28 out 2016, 04h46 - Publicado em 9 dez 2014, 08h30

Uma feijoada bem-feita, com todos os pertences, como se usava dizer, é uma coisa muito boa. Maravilhosa, eu diria. Mas é preciso ter uma certa cultura gastronômica para apreciar devidamente esse prato divino. Vamos reconhecer: quem vê pela primeira vez a iguaria se assusta com sua aparência. Quando um estrangeiro amigo nos visita, é uma temeridade convidá-lo para uma feijoada, pois as pessoas gostam de saber o que estão comendo, e quem olha para aquele festival de negrumes não pode supor do que se trata. Convide, sim, mas explique antes, pacientemente, o que é. O feijão é simples. E as carnes? Uma feijoada de fé tem que ter paio, linguiça, carne-seca – gorda e magra –, língua defumada, orelha, rabinho, toucinho, lombo, costela, carne de boi, bacon e chispe – o pé do porco.

Além disso, como acompanhamento, tem o arroz, a farofa, a couve, a laranja (seleta) e o torresmo, a oitava maravilha do mundo, que é o couro do porco frito. Às vezes ele vem até com um fiozinho de cabelo, prova cabal da autenticidade do produto. Tudo regado com uma boa pimenta-malagueta, é claro.

Para que esse manjar dos deuses seja servido condignamente, as carnes devem ir à mesa separadas, e só quem conhece e aprecia reconhece, num primeiro olhar, todas elas. Se não sabe, alguém terá de explicar. E, se for em outro idioma, a situação se complica. Agora, antes de o calorão do verão chegar, é o momento apropriado para as feijoadas. Tudo começa com as batidas. Depois de umas três, com o samba como fundo musical, é servida a feijoada, e é preciso um guia que fale muito bem a língua do turista para traduzir, item por item, o que contém cada travessa. Com os franceses, não tem problema, pois eles comem qualquer coisa.

Mas, com os gringos mesmo – americanos e alemães –, a coisa já fica mais perigosa. E a pimenta, como dizer que é fundamental? Passado o trauma inicial, vale ir fundo e levá-los a um restaurante baiano, fazê-los provar um acarajé e um sarapatel com bastante pimenta-de-cheiro mais um vatapá, um siri-mole ou uma simples moqueca com muito dendê. Talvez eles passem mal, tudo tem seu preço.

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Virando a página: outro dia fui a um restaurante chique e moderno no Rio e quatro pratos foram servidos. Detalhe: a louça, branca, era quadrada e gigantesca. A primeira iguaria foi uma espécie de bolinho – delicioso, por sinal – recheado de foie gras; um só. A segunda, três dedinhos de sopa com uns legumes cortados na vertical, com (me contaram) uma fatia de atum tão fina, mas tão fina, que não a percebi. A terceira, pasmem, era um camarão. Um triste e solitário camarão, sem acompanhamento, reinando absoluto no prato imenso. De dar pena sua solidão.

Por fim, três pedacinhos ridículos e saborosos de carneiro que meu gato comeria em duas mordidas. É triste a gente sentir que não consegue acompanhar os tempos modernos. Eu tento e, em muitas coisas, consigo. Mas, na gastronomia, é inútil, já desisti. Por isso, quando combino de jantar com alguém, já no telefone pergunto: “E onde vamos?” Se for num desses modernos, estou fora. Afinal, respeito é bom e eu gosto. Um camarão sozinho num prato, fala sério. Os restaurateurs, além de fazer muita gente de boba, devem estar bilionários. Esse tipo de comida é caro (pra nós) e tem levado alguns chefs a ficar ricos de um dia para o outro. E essa profissão, nos tempos atuais, é muito mais promissora do que a de economista.

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