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“Disseram que eu não era índia por ser educada e ter etiqueta”

Artista plástica Arissana Pataxó produziu obra questionando o estereótipo dos povos indígenas. Ela é a primeira índia a concorrer ao Prêmio PIPA, importante premiação de arte contemporânea

Por Aline Takashima (colaboradora)
Atualizado em 12 abr 2024, 15h16 - Publicado em 5 ago 2016, 06h01

Sentada em uma rede vermelha, a artista plástica Arissana Pataxó, 33 anos, segura o computador, olha para a câmera e pergunta: “Oi. Está me ouvindo? Alô, alô”. Cercada por árvores e o canto dos pássaros, ela circula entre dois mundos: o dos índios e o do homem ocidental. Quando criança, perdia a noção do tempo desenhando na areia. Utilizava todo o material que encontrava para criar formas e criaturas, seja com papel, caneta, tinta e argila. Hoje, ela é professora de artes em Pataxó, e a única índia que concorre ao Prêmio PIPA, uma das maiores premiações de arte contemporânea do País.

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Arissana morou nas margens de diversos rios da Bahia. Mas, recorda com carinho do rio Jucuruçu, que significa “cobra grande”, em tupi. A quinta dos oito filhos de Meruka e Wilson cresceu pintando panos de prato com a mãe e vendo o pai esculpir animais em madeira. O pai agricultor ainda tocava sanfona e viola caipira. “As minhas primeiras referências de arte são familiares”, resume a artista que viveu até os 16 anos próxima ao rio e depois mudou-se para Pataxó de Coroa Vermelha, em Santa Cruz Cabrália, na Bahia. Quando foi aprovada no curso de Artes Plásticas, na Universidade Federal da Bahia, em 2005, enfrentou uma realidade que até então não conhecia. Era diferente dos demais. “Escutei diversos comentários como: ‘Ah, você não é índia. Você é educada e tem etiqueta’, ‘índio não frequenta shopping’, ‘índio não tem sobrancelha e só existe na Amazônia’.”

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Arissana cresceu nas margens dos rios da Bahia. Obra “Dxahá patxitxá kuyuna”, 2011

Por conta dos preconceitos que sofreu, Arissana criou a obra Mikay, que significa “pedra que corta”. A peça é um facão de cerâmica com a pergunta: “O que é ser índio para você?”. A arma representa os primeiros contatos entre os povos indígenas e ocidentais e a frase remete aos estereótipos que a artista escutou. “Cada pessoa tem um índio fictício na cabeça. Essa imagem é construída pelos livros de literatura, pelas escolas, pela mídia. Mas nós somos um povo que vive na floresta e também na cidade. É uma diversidade muito grande. É um erro considerar que índio é tudo igual”, explica.

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Obra “Mikay”, de Arissana Pataxó questiona a figura do índio no imaginário popular ocidental

De fato, os índios não são todos iguais. Ao contrário de outros povos Pataxós que vivem em zonas rurais e litorâneas, a Coroa Vermelha, onde Arissana mora, é uma aldeia urbana. Conta com uma população estimada em cinco mil habitantes que vive do artesanato, agricultura e turismo. Arissana é professora de artes da escola pataxó, que possui 300 alunos matriculados. “O povo pataxó é um dos poucos conhecidos na região. É um povo que resistiu quando os ocidentais chegaram em Porto Seguro e Santa Cruz Cabrália”, resume orgulhosa. Para ela, concorrer ao Prêmio PIPA ajuda a divulgar tanto o seu trabalho quanto a arte indígena, especificamente dos pataxós. “É muito relevante para o Brasil, pois algumas pessoas ignoram que nós existimos. Acham que os índios viveram somente no passado. Alguns só pensam na região amazônica, mas há índios em todos os lugares do Brasil, inclusive na Bahia.”

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Obra sem título, 2009

Além de Arissana, outros dois artistas indígenas concorrem ao Prêmio PIPA. São eles, Jaider Espell, do grupo Macuxi e Isaías Sales, da etnia Kaxinawá. Embora com produções distintas, eles apresentam algumas semelhanças, como explica o curador do Instituto PIPA, Luiz Camillo Osorio. “A arte contemporânea indígena dialoga com o universo do ocidente, mas possui uma perspectiva muito própria que pertence aos imaginários ancestrais.”

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Arissana é a única mulher do grupo de índios artistas concorrendo ao prêmio. Mari Corrêa, criadora de oficinas de cinema em aldeias do Xingu e finalista do Prêmio CLAUDIA na categoria Cultura ressalta que as mulheres estão conquistando espaços e o reconhecimento de artistas indígenas é um sinal deste momento rico. Berna Reale, vencedora do Prêmio PIPA na categoria online, em 2012 e finalista do Prêmio CLAUDIA, no ano passado comemora a participação de Arissana na premiação. “Qualquer abertura para as mulheres é importante. Na história da arte, a mulher sempre foi submetida a um segundo plano. Ainda há um longo caminho, mas o mais importante é insistir para que os gêneros tenham a mesma oportunidade e visibilidade.”

Arissana Pataxó
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Arissana e a filha brincam na rede

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Arissana não sabe dizer se os homens e as mulheres pataxós possuem, de fato, as mesmos oportunidades, mas afirma que as mulheres pataxós exercem papel de influência na casa e na família. “Tanto as que trabalham na roça quanto as que fazem artesanato são trabalhadoras. Elas batalham para ganhar o sustento da família.” Em seguida, a artista plástica abre um sorriso para a filha de três anos, Atxinãy (“Minha filha bonitinha”, em pataxó). A criança sobe na rede e se espreguiça na perna de Arissana. Chegou a hora da mãe e filha desenharem em uma folha em branco.“Assim como eu, ela adora pintar”, confidencia.

Saiba mais sobre a artista Arissana Pataxó.

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