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3 jogadoras profissionais que arrasam e lutam contra o preconceito

O preconceito com as garotas que encaram torneios de games ainda é grande. Mas essas três mulheres não fogem da briga e lutam por igualdade round por round!

Por Rafael Cezar Argemon (colaborador)
Atualizado em 21 jan 2020, 23h39 - Publicado em 24 abr 2015, 13h07

Se entre as desenvolvedoras de games e as fãs dos jogos eletrônicos as mulheres conseguem avançar a passos largos, rumo a um papel de destaque, entre as jogadoras profissionais esse caminho está no início. Principalmente no Brasil, nessa área o preconceito com as garotas que encaram torneios ainda é grande. Mas elas não fogem da briga e lutam por igualdade round por round! Finalizando nossa série, conheça três jogadoras que provam seu valor dentro de um ambiente em que precisam não apenas vencer partidas, mas também a desconfiança dos homens.

Anne Caroline Pereira de Melo (mais conhecida nos torneios como “Carol Mystique”), 26 anos, nasceu e vive atualmente em Anápolis (GO).

Qual foi seu primeiro contato com games?

Jogo desde os meus nove anos. Comecei com o Mega Drive, meus preferidos eram Sonic the Hedgehog e Michael Jackson’s Moonwalker.

Quais seus jogos preferidos? Por quê?

Gosto de variados estilos de jogos, sendo que meus jogos preferidos são: Crossfire, Grand Theft Auto, Far Cry, League of Legends, Counter-Strike: Global Offensive, Assassins Creed e Command and Conquer.

Quando e por que você decidiu participar de torneios de games?

Participo de torneios desde 2010. Comecei por um único motivo: queria provar para muitos que eu era tão capaz quanto eles. Sofri bullying de alguns jogadores do profissional na época e isso me deu mais motivação. Com o tempo, vi que era imaturidade de minha parte ligar para as provocações, mas não posso negar que aquele sentimento me levou até onde cheguei. Aprendi a amar jogar como profissional. É uma paixão viciante para mim. 

Quais as melhores e piores recordações que você tem de um torneio de games?

Entre as melhores recordações está a classificação para o CF Stars (torneio mundial do jogo Cross Fire) quando praticamente ninguém acreditava. Aquela vitória nos deu a vaga para o CFS Season 2, que aconteceu na China. A outra foi o ótimo resultado que conseguimos no Mundial. Até então, foi o melhor de todos entre times brasileiros. Foi muito gratificante. As piores recordações são as derrotas. Odeio perder. Mas mesmo odiando perder, percebi que o mais importante é aprender com suas derrotas.

Como foi participar do mundial de Cross Fire?

Foi incrível! Engraçado, a ficha só caiu quando cheguei em casa. Aprendi muito com essa experiência lá fora. Mudei muito meu jogo desde que cheguei. Participar do Mundial me fez evoluir. 

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Você acha que as mulheres têm menos espaço em torneio de games? Por quê?

Acho que em questão de torneios está tudo como deveria ser. Acho ridículos esses torneios femininos! Mulheres têm capacidade sim de jogar contra homens ou com eles. 

Você acha que rola preconceito dos homens em aceitá-las como jogadoras que estão à altura deles? Por quê?

Claro que sim. Conquistar seu espaço não é fácil. Eu comecei a jogar com nome de homem nos jogos para não ter de escutar piadinhas de mau gosto. Para eles, sempre haverá um homem melhor do que eu. Mas acho que isso não é apenas no jogo. Essa situação é uma realidade na sociedade como um todo. Por isso, não os culpo muito por essa atitude. O respeito ao próximo vem de berço. Há muitos caras por aí que acreditam no potencial de jogadoras mulheres. É muito complicado ser mulher em um torneio de games. Ainda mais como CPT (capitã de time) de equipe. Já montei vários times nos quais se fosse um CPT homem, eles teriam ouvido e seguido o que eu estava passando. Isso é inadmissível para mim. Mas foram poucas vezes que tive de tomar atitudes mais drásticas. Nas partidas sempre há alguém falando: “Tira essa Mytique (apelido que Carol usa no jogo), ela e horrível!”. E isso acontece mesmo quando eu defino alguns rounds. Isso me deixava muito mal no começo, mas aprendi a lidar com essa situação.

Que dicas você daria para uma garota que quer participar de um torneio?  

Dedique-se. Seja em um time feminino ou misto. Dê o seu máximo sempre. Você é capaz, sim! Se eu consegui, você consegue. É verdade que é um caminho longo e duro, mas no final compensa. Boa sorte!

Natália Franco, 22 anos, nasceu e vive atualmente em São Paulo (SP).

Qual foi seu primeiro contato com games?

Aos três anos de idade. Antes mesmo de eu pensar em nascer, meu pai era proprietário de uma loja de som e videogames. Nasci e cresci dentro da loja jogando Super Nintendo. 

Quais seus jogos preferidos? Por quê?

São muitos. Todos os jogos da franquia Mario. Minha primeira memória como criança foi segurando um controle de Super Nintendo e jogando Mario World. Fez parte da minha infância, adolescência, e até hoje eu jogo em casa! Mas tem também o Top Gear 2000, a série do Kirby, Dota 1 e League of Legends.

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Quais foram os seus primeiros passos e até onde você chegou nessa área dos games?

Comecei a participar de jogos por causa de um ex-namorado. Os amigos dele jogavam em campeonatos e me chamavam para participar também. Ali cresceu a minha necessidade de competitividade com os jogos eletrônicos. Antes eu tinha essa competitividade aliada apenas aos esportes comuns. Sempre joguei vôlei, futebol e handball. O espírito de querer ganhar é o mesmo.  Depois que parei de jogar Dota 1, fui para o League of Legends. Participei de times competitivos com jogadores profissionais. Chegamos a ganhar dois campeonatos divulgados por uma comunidade no Orkut. Depois disso, recebi uma proposta de fazer um time feminino e recrutar garotas para ensiná-las a jogar. Na época era raríssimo ver alguma garota jogando. Hoje em dia é mais comum. Com esse time ganhei campeonatos femininos online e fomos chamadas para jogar na paiN Gaming, que hoje é uma Organização de E-Sports brasileira conhecida mundialmente. Foi ali que ficamos conhecidas, que provamos o gosto de o que era ser uma jogadora profissional, apesar de não se comparar com a estrutura das equipes de meninos que jogavam os campeonatos grandes. Conseguimos ficar bem conhecidas no “cenário feminino”. Mais times foram surgindo, e na época, depois da BGS 2012 (a feira de games Brasil Game Show) saímos da paiN e fomos para a Nex Impetus, nesta época a paiN não queria mais investir em time feminino, então encontramos a saída quando a Nex nos convidou a fazer parte da equipe. Ficamos pouco tempo na Nex, sofremos com a falta de disponibilidade para treinar e a desmotivação. Depois de algum tempo, a RMA E-Sports nos chamou para fazer parte da equipe, mas as outras meninas não aceitaram. Fui sozinha com a promessa de que faria um time melhor do que o anterior. A partir daí, começamos a recrutar. Participamos de um campeonato presencial e vários offline, chegando a pegar 3º lugar no presencial e oitavas de final na Go4LOL. Mas por falta de disponibilidade para treinar, o time acabou. Hoje só jogo por diversão, mas ainda faço parte da RMA E-Sports como gestora competitiva.

Você acha que rola preconceito dos homens em aceitá-las como jogadoras que estão à altura deles? Por quê?

Olha, preconceito há em todas as áreas, não só nos E-Sports. E aqui, principalmente, não é diferente. Ouvimos todo tipo de ofença quando estamos jogando. Mas acredito que não seja só por sermos mulheres. Eles xingam qualquer um mesmo. Ser mulher só faz acrescentar alguns adjetivos na lista de xingamentos deles. Temos de considerar também que a quantidade de homens que jogam não se compara a quantidade de mulheres. E quando eles perdem para uma mulher, ficam “putos”!

Já vi algumas garotas reclamando sobre o nível de competitividade dos homens e que isso acaba afugentando as mulheres de torneios. Você acha que isso realmente atrapalha? Há outros motivos para essa escassez de mulheres em competições de games?

Eu não concordo que o nível de competitividade dos homens influencie na falta de mulheres hoje nos torneios. Pelo contrário, para muitas das minhas amigas, e até eu, serve muito de exemplo e admiração! É o nosso sonho estar lá. Até porque hoje em dia há campeonatos para todos os tipos de jogadores, dos mais inexperientes até os profissionais. A escassez de mulheres nas competições se dá por três motivos. O primeiro são os times que mudam de line up o tempo todo. O segundo são os compromissos fora do jogo. Estudos, trabalho, namoro… Isso influencia muito. Para a maioria dos pais, não é “certo” ver a filha enterrada no computador. E o terceiro é o espírito competitivo. Muitas meninas jogam com outras meninas ou somente com amigos, mas nunca pensaram em levar o jogo a sério. Às vezes só o que elas precisam é de um empurrãozinho. A grande maioria das meninas que recrutávamos para os times nunca haviam jogado no nível competitivo que os torneios demandam. Elas nem sabiam como se comportar em um time. Muitas delas curtiram muito, mas algumas não se adaptaram.

Alice Grosseman Mattosinho, 24 anos, nasceu e vive atualmente em Florianópolis (SC).

Qual foi seu primeiro contato com games?

Não lembro exatamente. Desde muito pequena. Meus vizinhos tinham um Atari e todo mundo se reunia na casa deles para jogar, e minha vizinha tinha um Super Nintendo também. Acho que esse foi o primeiro contato, e foi amor à primeira vista.

Quais seus jogos preferidos? Por quê?

Tenho muitos jogos preferidos, cada um com sua importância. Tive um fascínio por The Last of Us desde que foi lançado. Ele não apenas representou personagens fortes e com motivações muito críveis, como também apresenta uma história muito bem executada, que fortalece os laços e características de cada personagem. Não existe ninguém “fraco” e mesmo sendo um jogo linear, cada pequeno detalhe foi feito com maestria. Mas na minha lista também coloco The Legend of Zelda: Ocarina of Time, que está há anos no meu topo, e Vampiro: A Máscara, que não é um jogo de videogame, mas um jogo de RPG de mesa que me influenciou muito a ter um gosto por criação de personagens. Hoje trabalho como ilustradora, criando concept art para jogos e esse gosto veio de lá.

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Quando e por que você decidiu participar e organizar torneios de games?

Gosto muito de jogos competitivos, principalmente de luta. Acho que a parte da competição com outra pessoa torna qualquer jogo “infinito”, no sentido de sempre ter alguma coisa nova para aprender. Como gosto de desafios, foi algo natural participar de torneios. Depois de participar e aprender um pouco sobre como funcionam as chaves, tipos de torneio e tudo o mais, organizei alguns simplesmente pela diversão de ter gente nova para competir, ou para tentar ganhar daquele amigo que joga melhor do que você.

Quais as melhores e piores recordações que você tem de um torneio de games?

Tenho muitas recordações boas e poucas ruins. Fiquei muito feliz por ter ganhado o segundo campeonato de Street Fighter IV da UNIVALI (Universidade do Vale do Itajaí), que também organizei. O legal foi ver 32 pessoas participando, torcendo e se divertindo. Outra lembrança bem legal foi o WP Cup em 2012, em São Paulo. Fora a parte de participar em si, acho super legal torcer pelos outros. Meu namorado ficou entre os 10 melhores colocados e tivemos a chance de conhecer pessoalmente muitos outros jogadores com os quais só conversávamos online. De experiências ruins em campeonatos, felizmente tenho muito poucas que me marcaram. Talvez uma das mais chatas aconteceu quando um jogador disse, após eu cumprimentá-lo: “Pode deixar que vou pegar leve, linda”. Quando estamos presencialmente não é tão ruim quanto jogar online, onde chovem insultos machistas ou comentários relacionados à aparência.

Você acha que as mulheres têm menos espaço em torneio de games? Por quê?

Talvez não literalmente, mas é complicado porque o ambiente não é necessariamente muito atrativo. O estigma é bem antigo, acho que desde que alguém convenceu o mundo de que jogar é coisa de homem, então muitas mulheres também foram convencidas disso. Geralmente, torneios presenciais são melhores, porque acho que as pessoas se controlam, pois não estão protegidas por uma tela. Nas minhas experiências, ter mulher jogando chama bastante atenção por ser algo raro, então é mais difícil não ficar nervosa na hora de jogar. Sinto ao mesmo tempo um peso de que se eu perder, eu estarei provando que “mulher não sabe jogar”, já que isso é encarado como algo natural. Se um cara perde, é porque ele não sabe jogar, mas se uma mulher perde é porque mulheres em geral não sabem jogar. Acho isso bem chato.

Você acha que rola preconceito dos homens em aceitá-las como jogadoras que estão à altura deles? Por quê?

Sim, principalmente jogando online. Falando de uma maneira geral, parece que muita gente não quer acreditar que mulher sabe jogar. Não podem aceitar o fato de estar perdendo para uma garota, então trazem todos os holofotes para cima de você, só esperando você cometer algum erro. É uma pressão constante, bem complicado. Muitas vezes evito usar o microfone (que é um recurso importante) porque não quero me incomodar com as pessoas descobrindo que é uma mulher jogando. Isso normalmente resulta em piadas machistas ou cantadas.

Já vi algumas garotas reclamando sobre o nível de competitividade dos homens e que isso acaba afugentando as mulheres de torneios. Você acha que isso realmente atrapalha?

A falta de representatividade faz parecer quase impossível chegar ao topo às vezes, então acho que influencia sim. Mas o motivo principal é o conjunto de fatores relacionado a mulheres não saberem jogar – segundo boa parte do mundo. Acho que repetem tanto isso para nós, que uma hora acabamos acreditando, e quem se aventura nem sempre é bem recebido.

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Que dicas você daria para uma garota que quer participar de um torneio?

Treine o seu jogo e ignore qualquer insulto. É mais fácil falar do que fazer, claro, mas não deixe de ir a torneios só porque algum babaca disse que você não sabe jogar. Se você jogou com alguém que ajudou ou que foi divertido, busque esses amigos para treinar junto. E sempre tenha em mente que as coisas estão melhorando, e que vão ter outras mulheres na luta.

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