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Aborto: depoimentos de quem fez

Depoimentos sobre aborto. Uma fez e se arrependeu. Outra fez e nunca sentiu culpa. Duas mulheres que seguiram caminhos opostos mostram como, apesar da polêmica pública sobre o assunto, lidar com a interrupção de uma gravidez é uma viagem pessoal

Por Redação M de Mulher
Atualizado em 20 jan 2020, 16h13 - Publicado em 19 out 2010, 21h00

Interromper uma gestação pode ser seguido de muito arrependimento e culpa
Foto: Getty Images

“Aos 19 anos, fiquei grávida. Eu e meu namorado usávamos camisinha, mas um dia ela estourou. A menstruação atrasou, fiz um exame de sangue que confirmou: gravidez. Contei ao meu namorado e ele me disse que preferia ter o filho. Já minha mãe não teve dúvidas: falou que eu teria de tirar o bebê. Na época, eu cursava pré-vestibular e não trabalhava, mas tinha dúvidas se queria abortar ou não. Tomei a decisão quando percebi meu corpo mudando. Pensei: ‘tem uma criança dentro de mim!’.

Falei para minha mãe que não queria abortar, mas ela foi enfática: se insistisse nisso eu iria para o olho da rua. Cedi à pressão e fui a uma clínica que uma amiga dela indicou. Quando chegamos lá, me examinaram e marcaram para aquela noite. Minha mãe não pôde ir porque tinha prova na faculdade. Eu já não estava mais falando com o meu namorado, que nunca gostou da ideia do aborto. Então, fui sozinha. Fiquei em uma sala com oito garotas. Uma ia abortar pela quarta vez. Outra tinha traído o noivo e ficado grávida. Fui a primeira a ser chamada. Tomei anestesia e apaguei. Quando acordei, me avisaram que poderia ir embora e que era normal ter sangramento na primeira semana. Quando cheguei em casa, bateu o arrependimento e saí quebrando o que via na frente. Sangrei um mês inteiro.
Meu ginecologista encontrou restos placentários dentro de mim. Me internaram para fazer o esvaziamento do útero. Fui levando uma vida normal, até retomar meu namoro no ano seguinte, quando comecei a sentir dores por todo o corpo e a me entupir de remédios. Acabei no hospital e o namoro terminou de novo. Depois dessa crise, comecei a fazer terapia para tratar minha culpa. Quase não falo mais com minha mãe. Há dois anos, me casei, mas não penso ainda em ter filhos. Às vezes, quando vejo uma criança, penso no bebê que poderia ter tido, em como ele seria. Jamais me esquecerei do que fiz. Jamais esquecerei do que fiz. Quando vejo uma criança, penso em como seria o meu bebê”

Renata, 27 anos, publicitária

“Em 2008, descobri que estava grávida do meu segundo filho. Não havíamos planejado. Meu marido adorou a notícia, mas eu, não. Na época, trabalhava vendendo brindes corporativos, não aguentava mais meu emprego, não tinha convênio médico e, por experiência, sabia o tamanho do perrengue de ter filho dependendo de hospitais públicos. Criar um é diferente de criar dois e a Malu ainda era muito pequena na época. Estava convicta da minha decisão, mas meu marido ficava tentando me dissuadir. No fundo, ele sabia que não teríamos condições financeiras para dois filhos. Meus pais, que são evangélicos, também eram contra, mas não teve jeito. Para não ter perigo de me arrepender ou desistir, resolvi tudo rápido. Entre a descoberta da gravidez e o aborto se passaram apenas cinco dias. Lógico que tive momentos de fraqueza.

Pensei se o que estava fazendo era correto. Sou cristã, não frequento a igreja, mas acredito em Deus. Pedi a ele que se abortar não fosse a coisa certa a fazer que não permitisse. Mas aconteceu. Fui a uma clínica ginecológica num bairro legal e paguei R$ 2.500 em dinheiro pelo aborto. Tudo muito discreto. Apesar do local parecer seguro, fiquei assustada. Estava fazendo algo ilegal e tinha receio de que a cirurgia desse errado. Meu medo se confirmou. Logo após tomar a anestesia, tive uma convulsão, reação alérgica ao medicamento.

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Foi tenso. Estava meio dopada e não tinha muito consciência do que estava acontecendo. Quando acordei, o médico me explicou o que tinha se passado. Graças a Deus, não fiquei com nenhuma sequela. Minha recuperação foi rápida. Tomei uns remédios para cólica e dias depois estava menstruada. Hoje em dia, nem penso no assunto. Não questiono se o que fiz foi certo ou errado. Estou em paz comigo mesma. No ano que vem, quero ficar grávida de novo. Eu e meu marido já estamos nos preparando para sermos pais novamente.”

Paula, 26 anos, produtora de moda

Pelo mundo afora

Atualmente, a legislação brasileira só autoriza o aborto em casos de estupro ou risco de vida para a gestante. Até quando o feto sofre de anencefalia (má-formação do cérebro que impede a vida após o nascimento) é necessário pedir autorização judicial para abortá-lo.

Canadá: desde a legalização, em 1988, o aborto vem diminuindo a cada ano.

Holanda: o país legalizou a prática em 1981 e registra o menor número de abortos no mundo graças à eficaz política de educação sexual.

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China: além de ser legal, o governo chinês incentiva as mulheres a abortarem para conter o excesso populacional.

Polônia: na época do comunismo, era permitido em qualquer situação. Depois do fim do regime, só podem recorrer a ele mulheres que correm risco de vida. 

. O aborto é totalmente permitido em 56 países
. 7% das brasileiras em idade reprodutiva já abortaram
. No Brasil, são feitos cerca de 1 milhão de abortos ilegais por ano, estima a Organização Mundial da Saúde (OMS).
. Procedimentos malfeitos, sem condições de higiene ou segurança, são a quinta causa de morte materna no país.

Debate permanente

Nos últimos 60 anos, pelo menos 87 projetos de lei discutiram a legalização da prática na Câmara dos Deputados. O perfil médio da brasileira que interrompe a gravidez:

. Tem entre 20 e 29 anos
. Vive uma relação estável
. É católica
. Mãe de pelo menos um filho

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Fonte: pesquisa da Universidade de Brasília (UnB) e Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) 

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