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O jeito certo de usar adoçantes

Pesquisa mostra que os substitutos do açúcar podem ter efeito oposto ao esperado: em vez de derrubar, fazem a glicose no sangue subir. Mas a descoberta não é suficiente para bani-los - apenas sugere usar com moderação.

Por Cristina Nabuco (colaboradora)
Atualizado em 28 out 2016, 14h39 - Publicado em 3 fev 2015, 09h06

Quem trocou o açúcar por um edulcorante – o nome técnico dos adoçantes – tomou um susto com um estudo publicado na revista científica Nature em setembro passado, que acabou tendo enorme repercussão na mídia do mundo todo ao condenar os produtos consumidos por diabéticos e interessados em perder peso. A notícia: cientistas do Weizmann Institute of Science, em Israel, forneceram água com adoçante (aspartame, sucralose ou sacarina) a ratos de laboratório e obtiveram um resultado surpreendente. “Descobrimos que os adoçantes artificiais podem induzir uma elevação nos níveis de glicose no sangue, exatamente o que pretendíamos evitar ao recomendar seu consumo”, disse na ocasião o imunologista Eran Elinav, coordenador da equipe. O aumento da glicemia foi comparável ao de animais que beberam água com açúcar. Como a maior parte dos adoçantes não é absorvida pelo corpo, os pesquisadores mostraram que os responsáveis pelo aumento da glicose podem ser as bactérias da flora intestinal – e a atividade delas seria influenciada pela presença dos substitutos do açúcar. “Certas bactérias malévolas atrapalham a ação da insulina e podem predispor ao aparecimento de diabetes”, afirma a endocrinologista Maria Edna de Melo, diretora da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso). A insulina, hormônio produzido pelo pâncreas, é essencial para que o açúcar dos alimentos chegue até as células, em vez de ficar circulando, em níveis altos, na corrente sanguínea. Na segunda parte do estudo, os cientistas forneceram doses máximas diárias de sacarina a sete pessoas durante uma semana: quatro apresentaram aumento nos índices de glicose no sangue.

Baixada a fervura, a notícia se depurou. “O número de voluntários foi pequeno para se afirmar que o uso de adoçantes favorece a resistência à insulina e o aumento da glicemia em humanos, o que configura um quadro de pré-diabetes”, comenta a endocrinopediatra Denise Ludovico, integrante do Centro de Pesquisas Clínicas (CPClin), em São Paulo, e voluntária da Associação Diabetes Brasil. Primeiro, porque nem tudo o que se observa em camundongos se verifica em seres humanos. Segundo, porque a amostra era composta de pessoas em tratamento de obesidade. “Trabalhos anteriores revelaram que a flora intestinal do obeso é diferente da apresentada pelo magro. Então, não dá pra atribuir a culpa só ao adoçante”, diz a médica.

Na opinião dela, no entanto, há uma lição que se deve tirar desse estudo: vale a pena ter cautela e usar o produto com moderação. “Criou-se aversão ao açúcar e disseminou-se a ideia de que alimentos diet são mais saudáveis e podem ser consumidos à vontade, o que não é verdade”, adverte Denise. E conclui: “O excesso pode trazer problemas”.

Embora sejam indicados apenas para quem precisa restringir a ingestão do açúcar em decorrência de doenças como diabetes ou obesidade, os adoçantes dietéticos caíram no gosto popular. O motivo: ingerimos menos calorias quando optamos por eles porque usamos em menor quantidade, já que têm maior poder de adoçar. Um sachê – 0,8 grama – de aspartame, sacarina, sucralose ou ciclamato tem, no máximo, 3 calorias; um de estévia menos ainda, 0,81 caloria, enquanto um com 6 gramas de açúcar fornece 24 calorias, segundo o médico Durval Ribas Filho, presidente da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran). E sobre a adoçagem, lembre-se, o ciclamato aciona o paladar na proporção de 30 vezes mais que o derivado da cana; a sacarina, 400; o aspartame, 200; o acessulfame-K e a estévia, de 300 a 400 vezes; e a sucralose, 600. Assim, os adoçantes teriam a capacidade de satisfazer mais. O inconveniente de deixar um sabor amargo na boca (relatado no consumo de sacarina, acessulfame-K e estévia, e não na ingestão de aspartame e sucralose) foi contornado com a produção de blends, com edulcorantes em doses baixas. Por essas e outras, os adoçantes seduziram uma legião de pessoas interessadas em economizar nas calorias para emagrecer ou controlar o peso.

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Controvérsias e pesquisas

O mercado cresceu, ainda que a segurança desses produtos tenha sido questionada outras vezes. O mais antigo, a sacarina, extraída a partir de 1879, do tolueno, derivado do petróleo, quase foi proibida nos Estados Unidos nos anos 1970. Ratos de laboratório que receberam doses altíssimas da substância desenvolveram câncer de bexiga. No entanto, uma pesquisa divulgada em 2000 concluiu que os humanos reagem de modo diferente dos roedores e utilizam doses bem inferiores às testadas naquele estudo pioneiro. Já o ciclamato de sódio foi sintetizado em 1937, também com base em um derivado de petróleo. Ao seu consumo exagerado atribuiu-se uma relação com o câncer, o que não se confirmou nas análises posteriores. Em 1999, a Agência Internacional de Pesquisa sobre Câncer (ou Iarc), sediada em Lyon, na França, considerou que ele não é carcinogênico para humanos se utilizado dentro das doses preconizadas. O acessulfame-K, sal de potássio feito com um ácido da família do vinagre, também esteve na mira dos cientistas. Em 1988, testes com animais de laboratório realizados nos Estados Unidos o relacionaram a tumores benignos e problemas de tireoide. Como as denúncias não se comprovaram, esse edulcorante retornou ao mercado. A sucralose (ou açúcar invertido), extraída da cana-de-açúcar, esteve ligada em 2002 à maior incidência de câncer do trato gastrointestinal, também se ingerida em doses elevadas. Dezenas de estudos subsequentes não atestaram os efeitos tóxicos. Já a estévia, originária de uma planta sul-americana, a Stevia reubadiana, é tida como segura por ser natural. Para contrapor essa ideia, o Centro de Ciências de Interesse Público, ONG americana de defesa da saúde, mirou outro alvo: o açúcar branco. Mesmo sendo adoçante natural, ele engorda. E a obesidade pode levar a diabetes, doenças cardíacas e câncer. Portanto, o fato de a estévia ser natural não garante, por si só, que seja melhor que os demais.

Aspartame: o doce veneno?

O alvo das maiores críticas tem sido o aspartame, produzido acidentalmente em 1965 com aminoácidos (são eles o ácido aspártico e a fenilalanina) encontrados em carnes, ovos, peixes e queijos. Chamado de doce veneno por comunidades na internet que o condenam, ele já foi acusado de vários males, como provocar reações tóxicas, dores de cabeça, distúrbios visuais, perda de memória, esclerose múltipla, fibromialgia, câncer no fígado e no pulmão e doença de Alzheimer. Mas a má fama foi desfeita pela agência regulatória da Organização Mundial da Saúde (OMS). “Numa minuciosa revisão sobre todos os adoçantes artificiais, em especial o aspartame, publicada em dezembro de 2013, a agência não encontrou evidências conclusivas de seus malefícios”, explica Maria Edna de Melo. A ingestão dentro dos limites recomendados foi considerada segura. “Não há justificativa para que os diabéticos e as pessoas que precisam emagrecer excluam os adoçantes da dieta”, afirma a endocrinologista. Também não há recomendação para que recorram a alternativas supostamente melhores, como o xarope de agave e açúcar de coco. O primeiro, extraído de um cacto mexicano, empata com o açúcar da cana em calorias – 10 gramas, cerca de 2 colheres de chá, fornecem 40 calorias; a mesma porção de açúcar da cana, 39. O açúcar de coco corresponde à metade: 10 gramas têm 20 calorias. “A princípio, não há grande vantagem em adoçar com esses produtos”, observa a pesquisadora Denise Ludovico.

Apesar de terem se livrado de muitas das acusações, os adoçantes dietéticos não podem ser usados livremente. O aspartame é proibido para fenilcetonúricos, pessoas incapazes de produzir a enzima para metabolizar a fenilalanina, aminoácido encontrado nesse edulcorante. Por causa dessa carência, elas estão sujeitas a danos no sistema nervoso. A sacarina, o ciclamato e o acessulfame-K contêm sódio e são contraindicados para hipertensos. O acessulfame-K também é desaconselhado para portadores de distúrbios renais que precisam controlar a ingestão de potássio. E um alerta para crianças e gestantes: em geral, elas devem manter distância de adoçantes. “A menos que sejam diabéticas ou estejam muito acima do peso”, explica Denise Ludovico. Nesses casos, a preferência recai sobre a sucralose, que se mostrou segura nessas circunstâncias.

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Consumo consciente

De qualquer forma, quem não tem contraindicações precisa evitar abusos. Os usuários devem observar os limites diários determinados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Na conta, entram todas as gotinhas e sachês adicionados a cafezinhos, além de outros produtos diet consumidos, como refrigerantes, iogurtes, gelatinas, geleias, balas etc. A quantidade diária ideal é medida conforme o peso corporal. De acessulfame-K e sucralose, podemos ingerir 15 miligramas de cada por quilo. Se o uso é de aspartame, o recomendado é 40 miligramas; de ciclamato, 11; de estévia, 5,5; de sacarina, 5. Assim, quem pesa 60 quilos pode ingerir, no máximo, 900 miligramas de acessulfame-K ou de sucralose, e assim por diante. Vale tentar não ultrapassar a cota para não ter alta concentração de uma substância específica. Para simplificar, o melhor é seguir as orientações de Denise: o limite diário é de seis sachês do adoçante em pó, 10 gotas do líquido e uma lata de refrigerante dietético por dia. Além disso, é indicado ler as embalagens para fugir de escolhas erradas. Muitas vezes achamos que tomar um suco de fruta industrializado é bem melhor do que tomar refrigerante. Mas não é bem assim: “O volume de açúcar em um suco de caixinha pode ser tão grande quanto em um refrigerante comum”, alerta Maria Edna de Melo.

Nos produtos light ou zero, além de conferir as calorias, procure o adoçante usado. “O primeiro descrito no rótulo é o que vem em maior porcentagem”, ensina Denise. Prefira os que utilizem estévia ou sucralose ou alterne, consumindo produtos com adoçantes diferentes, para não extrapolar em nenhuma substância. Fique atenta sobretudo ao ciclamato, presente em vários alimentos industrializados. Não porque o ciclamato seja mais perigoso, mas, como ele é muito usado, o risco de ultrapassar o volume seguro acaba sendo maior.

O ideal, no entanto, é consumir alimentos ao natural. Por exemplo, frutas, além de fornecer fibras, saem do pé já “adoçadas”. Mais: o café é melhor com seu sabor real, que é amargo. Se for para adoçar, porém, e a pessoa não tiver diabetes nem problemas com a balança, pode usar um pouco de açúcar. Mas Denise Ludovico ressalta: “Não é preciso excluir o açúcar – nem os adoçantes – para sempre. O problema é a quantidade exagerada”. 

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