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Escritor conta como é possível encontrar o trabalho da sua vida

Para o australiano Roman Krznaric, a humanidade não precisa se resignar com a ideia de que todo trabalho é necessariamente enfadonho. Na entrevista abaixo, ele conta como é possível encontrar um trabalho edificante que faça diferença no mundo

Por Redação M de Mulher
Atualizado em 15 jan 2020, 12h37 - Publicado em 23 out 2013, 21h00
Escritor conta como é possível encontrar o trabalho da sua vida

Foto: Divulgação

Para muita gente, o problema com a tão execrada segunda-feira é ter que encarar um trabalho que já não traz satisfação e do qual é difícil abrir mão, seja pela segurança financeira que ele proporciona, pelo medo de a mudança ser malsucedida ou pelo “desperdício” dos anos de trabalho duro naquela carreira. Para o escritor australiano Roman Krznaric, autor de Como encontrar o trabalho da sua vida (editora Objetiva), esse compromisso com uma escolha do passado que não preenche mais as aspirações presentes é uma das principais razões pelas quais as pessoas permanecem em seus empregos mesmo quando estão infelizes. “É a teoria do ‘sorria e aguente’, segundo a qual devemos controlar nossas expectativas e reconhecer que o trabalho, para a maior parte da humanidade – incluindo nós mesmos -, é basicamente algo enfadonho e sempre será”, afirma Krznaric. “Sou mais esperançoso e defendo que é possível encontrar um trabalho edificante que amplie nossos horizontes e nos faça sentir mais humanos”.

Sociólogo por formação, o próprio Krznaric tentou diversos caminhos: foi jardineiro, professor universitário, jornalista e carpinteiro, antes de se tornar escritor. “Talvez o trabalho mais difícil tenha sido o de dono de casa em período integral depois que meus filhos gêmeos nasceram”, conta. Embora o título do livro possa sugerir que se trata de autoajuda corporativa, Krznaric escapa do gênero se valendo de contextualizações históricas, pesquisas científicas e relatos reais de pessoas que não encontravam propósito no trabalho e deram uma guinada na carreira. Como um assistente de vendas que se tornou embalsamador funerário e a engenheira da Nasa que hoje faz planejamento urbano.

São escolhas impensáveis até poucos séculos atrás, já que, ao longo da maior parte da história da humanidade, as opções de ocupação eram muito limitadas. Além disso, frequentemente a profissão do indivíduo estava presa à escolha dos seus pais ou às necessidades financeiras da família. Hoje, diante das opções de carreira, das quais embalsamento funerário e planejamento urbano são exemplos, acontece o paradoxo da escolha: a vastidão de possibilidades paralisa, em vez de libertar.

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No Brasil recentemente para lançar seu novo livro, Sobre a Arte de Viver (editora Zahar), e participar do The School of Life, do qual é um dos fundadores, Krznaric conta como é possível investir numa carreira que tenha sentido e faça diferença no mundo.

Alguns autores dizem que os membros da Geração Y são frustrados com suas carreiras porque cresceram se sentindo especiais e acreditando que o mundo está cheio de recompensas, apenas esperando por eles. E quando eles percebem que essa não é a realidade, vem a frustração. O que você acha disso?

Eu concordo que a frustração para muitos da Geração Y acontece porque eles têm expectativas incrivelmente altas sobre as recompensas do trabalho e elas nem sempre são atendidas. Parte do problema é não pensarmos que o trabalho dos sonhos pode ser difícil ou desafiador. Nós precisamos reconhecer que o sentido do trabalho dos sonhos frequentemente está relacionado justamente a trabalhar duro com aquilo que você se importa – e você pode não se sentir particularmente “especial” fazendo isso. Se existe o trabalho dos sonhos? Sim, claro – as pessoas geralmente se sentem satisfeitas quando estão usando seus talentos, perseguindo suas paixões e colocando seus valores pessoais em prática no trabalho. O erro é pensar que existe apenas um trabalho perfeito esperando por nós e tudo que precisamos fazer é encontrá-lo. Quando, na verdade, muitas carreiras diferentes podem satisfazer profundamente partes de quem somos.
 

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As redes sociais exacerbam as frustrações com o sentimento de “sou especial”, já que a maioria das pessoas mostra apenas os aspectos mais interessantes das suas vidas?

As redes sociais são problemáticas porque elas nos fazem sentir que todo mundo tem vidas mais excitantes e interessantes do que as nossas, o que pode trazer o sentimento de insatisfação e a falta de autoconfiança. De fato, as redes sociais não conseguem revelar a singularidade, a individualidade e a realidade humanas, já que acabamos nos definindo dentro de categorias limitadas, como nossos filmes e músicas favoritos. Uma pessoa é muito mais que isso! A cultura digital, como ela atualmente opera, diminui a complexidade humana.

No Brasil, as pessoas escolhem a carreira muito jovens, por volta dos 18 anos. É possível acertar na escolha com essa idade?

É extraordinariamente difícil ser um bom juiz da carreira certa aos 18 anos. Os seres humanos são muito ruins em imaginar seus próprios futuros. Você pode decidir se tornar um contador ou um designer aos 18 anos, mas ao longo do tempo tanto a carreira de contador ou de designer quanto você mesmo vão mudar, já que nossos interesses, valores e paixões mudam conforme vamos ficando mais velhos. Não é surpresa que você seja infeliz no seu trabalho aos 30 anos porque, de várias maneiras, você é uma pessoa diferente de quem você era aos 18. Precisamos compreender que mudamos ao longo do tempo e estar preparados para abraçar novas possibilidades de carreira conforme o tempo passa.

No seu livro, você diz que estamos errados quando permanecemos fiéis às pessoas que fomos, em vez de às pessoas que queremos ser. Como esse compromisso com as ambições do passado podem prejudicar o processo de mudança?

Frequentemente nós percebemos a necessidade de mudar, mas então olhamos para trás, para todo aquele tempo e esforço que colocamos na nossa carreira até agora – talvez dez longos e caros anos de estudo e treinamento para ser um advogado, por exemplo – e não queremos desistir de todo esse investimento. Por achar que abrir mão da atual carreira seja desperdício, tentamos aguentar, mesmo infelizes. Entretanto, precisamos perceber que o pior é chegar ao final da vida, perceber que você foi infeliz no trabalho durante 40 anos e desejar ter tentando outra carreira, por mais que tivesse sido um pouco doloroso e assustador na época. Esse tipo de arrependimento pode erodir seriamente a alma.

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É verdade que quem trabalha com o que gosta nunca terá que realmente trabalhar na vida? A paixão é suficiente para dar algum significado ao trabalho?

Não acredito nisso. O trabalho dos sonhos pode ser duro – seja fazendo pesquisas sobre câncer ou dando aulas para crianças. Isso não se parece necessariamente com o que nós tipicamente pensamos sobre “não trabalhar”, que é “lazer”. Por outro lado, quando você coloca seus talentos, paixões e valores na sua atividade, o trabalho não é um meio para um fim, como acontece com as pessoas que aceitam um trabalho por causa do salário que ele oferece. Desde que o que você faz pareça intrinsecamente valioso, mais do que apenas um meio para um fim, você vai experimentar o gosto de ter uma carreira gratificante na sua vida.

No seu livro, você sugere que as pessoas que querem mudar de carreira “ajam antes, pensem depois”. Mas como fazer isso sem se preocupar com a segurança financeira?

O truque é fazer o que eu chamo de projetos experimentais. Você não precisa entrar dramaticamente no escritório na segunda de manhã e pedir demissão. Você pode ficar no seu atual trabalho (e, consequentemente, manter sua segurança financeira), enquanto experimenta outras carreiras. Se você está infeliz como relações públicas, um projeto experimental que você pode fazer é ser webdesigner freelance nos finais de semana ou ensinar yoga nas noites de quinta. Gradualmente, fazendo mais e mais desses trabalhos paralelos, você adquire autoconfiança para a mudança maior, que é deixar seu velho trabalho para trás. Esse é um jeito muito efetivo – e realista – de “agir primeiro, pensar depois”.

É possível ter tudo – o trabalho da sua vida e família?

Desde os anos 1980, a ideia de “ter tudo”, em outras palavras, uma grande carreira, uma vida familiar na qual você possa se dedicar aos filhos e tempo para atividades de lazer, tem sido a aspiração final – especialmente para as mulheres. Fazer tudo isso é quase impossível, a menos que você tenha uma enorme rede de apoio e meios financeiros, como um parceiro que cuide das crianças quando você precisar ficar até tarde no escritório. O desafio é maior para as mulheres porque elas acabam sacrificando suas carreiras quando seus parceiros não estão dispostos a assumir deveres domésticos, como o cuidado das crianças e da casa. Os homens não estão dispostos a sacrificar nenhum sucesso profissional. Em minha opinião, a questão não deveria ser “como as mulheres podem ter tudo?”, mas sim “como ambos podem apoiar um ao outro de maneira que ambos possam ‘ter tudo’?”. E isso significa que os homens terão que começar a cuidar mais da família e dos deveres domésticos para que as mulheres não se vejam forçadas a colocar suas carreiras em segundo plano. Infelizmente, apesar de vermos muitos relatos sobre os “superpais”, que sabem trocar fraldas de olhos fechados, ainda não há muitos desses homens por aí.

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Empreendedorismo tem se tornado cada vez mais uma saída para a frustração na carreira. Esse caminho assegura satisfação?

Empreendedorismo pode ser uma maneira de sair da frustração, especialmente se você cria oportunidades para usar seus talentos. O problema é que a maioria dos empreendedores está perdendo um segundo ingrediente chave para o trabalho gratificante: colocar seus valores e ética em prática. O que as últimas pesquisas sobre carreira mostram é que as chances de ter satisfação no trabalho no longo prazo dependem de você colocar em prática ambos – talento e valores. Como o filósofo grego Aristóteles disse “Onde as necessidades do mundo e os seus talentos se encontram, lá reside a sua vocação”. Para seguir esse conselho, a coisa mais inteligente a se fazer é ser um empreendedor social – ou seja, começar um negócio no qual o objetivo não seja o lucro, mas sim a maximização do valor social ou ecológico do produto ou serviço que você oferece.

Como você encontrou o trabalho da sua vida?

Eu cometi muitos erros nas minhas escolhas de carreira. Sempre tentei ser experimental, colocando em prática os princípios do “agir primeiro, pensar depois”. Ensinei sociologia e política numa universidade, fui jardineiro profissional (nem de longe tão agradável quanto pensei que seria), jornalista e carpinteiro e sempre fui treinador de tênis e trabalhador voluntário. Agora sou escritor na maior parte do tempo, o trabalho mais emocionante de todos que já tive. Talvez o mais difícil tenha sido ser dono de casa em período integral depois que meus filhos gêmeos nasceram – um trabalho não remunerado, mas também o mais desafiador e incrivelmente recompensador.

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