Mulher, negra e pobre, venci na vida
Driblei o destino que me era dado como certo, abri meu próprio negócio e saí da favela
Só tenho a agradecer. Sou uma
pessoa realizada!
Foto: Arquivo pessoal
Nasci numa família de cinco irmãos, na favela do Jardim Maria Estela, em São Paulo. Meu pai era pedreiro e minha mãe empregada doméstica. Cresci vendo os dois se matarem de trabalhar sem construir nada. Minha mãe é uma lutadora, eu sempre quis ter a força dela, mas não o mesmo destino.
As minhas amigas, como quase todo mundo que vive na favela, não tinham perspectiva de vida e com 14 anos já estavam grávidas, trabalhando como faxineiras e babás, coisas que pra mim eu não admitia. Elas me julgavam prepotente, riam de mim. “Você sonha demais. O mundo nem olha pra gente. Acorda!” Mas eu sabia que podia. Decidi contrariar todas as estatísticas e mudar o meu destino.
Perdi empregos por ser favelada
Sempre estudei em escola pública e, aos 14 anos, fiz um curso técnico administrativo para poder trabalhar. Passei em um teste em um escritório de contabilidade, então trabalhava durante o dia e estudava à noite. Nos finais de semana distribuía panfletos nos semáforos.
Mesmo com dois empregos o dinheiro não dava. Então fiz um curso de contabilidade pra ganhar mais. O curso era particular, mas consegui pagar. Formada, fui procurar empregos melhores. Eu tinha 19 anos e participei de seleções em duas grandes empresas financeiras. Como o contador lida com muito dinheiro, é comum que os avaliadores visitem a casa dos candidatos pra saber se moram em locais que ofereçam riscos à empresa.
Na primeira seleção cheguei até a reta final, mas, quando disse à psicóloga que morava na favela, ela explicou que a empresa não poderia me admitir. Não desisti. Nem mesmo quando a mesma coisa aconteceu em outra seleção, de um jeito velado. Dizem que o negro é quem mais sofre preconceito, mas favelado sofre ainda mais. Naquela época aceitei a minha condição resignada. Eu achava que favelado não tinha direitos. Se fosse hoje, teria rodado a baiana.