Marilyn e o fardo de ser linda
Leandro Quintanilha fala de Marilyn Monroe, maior diva do cinema
Foto: Divulgação
“Sete Dias com Marilyn“, que estreia na sexta-feira (27), mostra os bastidores das filmagens de “O Príncipe Encantado”, de 1956, quando a diva de Hollywood vai à Inglaterra para contracenar com Lawrence Olivier. No entanto, como adianta o título filme, esta é uma história sobre os bastidores de uma mulher. Uma mulher lindíssima.
O filme é baseado no livro “O Príncipe, a Vedete e Eu”, de Colin Clark, que teve um romance platônico com Marilyn durante as filmagens, quando trabalhava como assistente de direção. Ver esta cinebiografia implica uma dificuldade incontornável: aceitar uma intérprete de Marilyn Monroe que não seja extraordinariamente bonita como o mito.
Mas por que isso é uma questão? Por que a beleza nos magnetiza tanto? Por que somos tão exigentes? Para o papel de Marilyn, e os enchimentos de sua caracterização, foi escalada a atriz Michelle Williams, de “O Segredo de Brokeback Mountain”. Seria ela bela o suficiente para o papel? O problema não é Michelle, mas como olhamos para Marilyn.
No filme, a atriz-personagem é constantemente bajulada pela equipe, apesar de ser uma profissional difícil, que se atrasa com frequência, não acerta as falas e tem crises de insegurança. Linda de se olhar, exaustiva de se conviver.
Habilidosa, Michelle mimetiza a beleza e o talento para a beleza que Marilyn também tinha – olhares e sorrisos; a voz suave, cheia de ar; o andar de passinhos curtos; os trejeitos de menina, aos 30. Porque beleza também é aprendizado (e condicionamento).
Contudo, por mais que a atuação seja convincente, pode demorar um pouco para que você a aceite como Marilyn: a fé cênica terá de enganar os olhos. Mas, isto feito, você vai perceber que Marilyn, a própria, era tão de mentirinha quanto a pinta que ostentava na face (um defeito calculado, para realçar a perfeição ao redor). A beleza era a sua principal personagem.
Sempre que atuava, Marilyn contava com o apoio de uma preparadora/babá, especializada no método de interpretação de Constantin Stanislavski. Uma tentativa de obter credibilidade e autoconfiança. E de encontrar a verdade de cada papel. Mas o que todos esperavam de suas personagens é que fossem belas e graciosas. Que fossem Marilyn Monroe. Encomenda que a atriz eventualmente recusava, mas que sempre acabava entregando.
A experiência de/com Marilyn nos conduz a duas conclusões: somos muito condescendentes com pessoas bonitas; por outro lado, nós as escravizamos com nossas expectativas. Assim como somos intolerantes com os feios, somos cruéis com os belos, por desejo ou inveja. E queremos deles sempre o mesmo, arrebatamento. Ainda que precisem se multiplicar e se repetir, como o retrato de Marilyn na pop art de Andy Warhol.
Numa cena emblemática do filme, Marilyn passeia com Colin durante uma folga, quando se os dois deparam com um grupo de jornalistas. “Eles querem que eu seja ela, não?”, pergunta ao acompanhante, como se dispensasse resposta. Então, Marilyn acena e sorri, linda, charmosa, como nós sempre a conhecemos. Ou desconhecemos.
Leandro Quintanilha trabalhou no Estadão e no UOL. Hoje, escreve para revistas. Ele adora livros, séries e filmes, que prefere analisar pela perspectiva comportamental. Leandro acha muito esquisito escrever sobre si mesmo assim, na terceira pessoa.
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