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Síndrome rara afeta mulheres que nascem sem o canal vaginal

Muito além do prazer, o sexo pode revelar situações complexas como as experimentadas por mulheres que se descobrem portadoras da Síndrome de Rokitansky

Por Laís Barros Martins (Colaboradora)
Atualizado em 20 jan 2020, 16h20 - Publicado em 10 abr 2017, 16h19

“Eu me senti muito sozinha”, diz Raiane Rodrigues, que, aos 22 anos, acaba de descobrir ser portadora da síndrome de Mayer-Rokitansky-Küster-Hauser (MRKH), também conhecida como aplasia mülleriana ou agenesia vaginal, na qual mulheres nascem sem o canal vaginal ou com o canal vaginal pouco desenvolvido.

Apesar da raridade – em torno de uma em cada 5 mil mulheres são afetadas – e dos tabus relacionados a questões ginecológicas, muitas mulheres de um grupo que reúne 300 delas se prontificaram a compartilhar sua história com a vontade comum de pôr fim ao preconceito, mas sobretudo para destacar os efeitos devastadores que as tomam.

“Fiquei assustada com o diagnóstico e muito insegura pela falta de informações. A primeira reação foi me fechar em minha aflição, me achava estranha, mas, com o passar do tempo, fui amadurecendo esses sentimentos em mim”, conta Michely Gehlen, que convive com a síndrome há 11 anos. Para Raiane, a descoberta envolveu a autoaceitação: “Meu coração ficava se questionando o porquê de eu ter de passar por essa situação que não escolhi”.

Por conta deste grande impacto emocional, “deve existir um trabalho multiprofissional, de ginecologistas para a correção da anomalia anatômica, mas também apoio e aconselhamento psicossocial em conjunto com a paciente e sua família para a preparação antes do tratamento”, aponta Bárbara Murayama, ginecologista e coordenadora da Clínica da Mulher do Hospital 9 de Julho.

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“Ter acompanhamento de especialistas, conhecer mais sobre a síndrome e saber que não estou sozinha gerou uma sensação de acolhimento e esperança. Depois de tanta insegurança, finalmente percebi que não sou bizarra. O sentimento de frustração logo se transformou em empoderamento e, principalmente, resiliência. Descobri que sou forte, e que meu valor vai além das minhas limitações. Aceitei que sou muito rara e passei a acreditar que sou capaz de superar todas as coisas”, conta Raiane.

Diagnóstico

Acredita-se que a causa desta má-formação do órgão sexual feminino seja genética, embora não se saiba exatamente por que isso acontece e quais genes estão envolvidos nesta desordem. “A síndrome refere-se ao desenvolvimento rudimentar ou à ausência congênita da vagina, com ou sem útero, e podem existir outras anomalias principalmente no sistema urinário (rim ou bexiga); má-formações esqueléticas (coluna vertebral, costelas e extremidades); ou ainda lesões do coração, da mão, surdez, fenda palatina e hérnias”, comenta Bárbara.

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“O exame físico não detecta nenhum problema, e o exame especular e de toque apresentam alterações naquelas com vida sexual ativa, com queixas de dor nas relações, infertilidade e casos de endometriose”, diz Bárbara. “Geralmente, a primeira reclamação é a ausência de menstruação, com dor ou não a depender da presença do útero e se há sangue represado”, como aconteceu com Raiane. “Consultei um ginecologista aos 15 anos porque ainda não havia menstruado, mas disseram para esperar e somente aos 17 fiz os exames que apontaram a ausência do útero e de um rim. O diagnóstico da síndrome demorou ainda outros cinco anos”, conta.

Além da falta da menstruação e, às vezes, disfunções sexuais, a impossibilidade de engravidar também é uma queixa destas mulheres. Além de se sentir “inferior em relação às outras mulheres não portadoras”, Raiane enfrentou o medo em relacionamentos – “achava que nunca encontraria alguém que aceitasse a minha condição” – e de não realizar a maternidade, embora hoje acredite que “filhos não são gerados somente no ventre, mas também no coração”.

Michely não tem o útero, o rim direito e algumas vértebras, e passou por uma cirurgia bem-sucedida em 2005 para correção do canal vaginal. Embora não menstrue e seja incapaz de engravidar, assegura que a questão sempre foi muito bem resolvida: “Não poder gerar filhos nunca me impediu de namorar e sou casada há 5 anos. Não penso em adoção nem barriga solidária no momento”.

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Em relação à fertilidade, Paulo Bianchi, coordenador do Centro de Reprodução Humana do Hospital Samaritano, aponta que os métodos de reprodução assistida em mulheres com a forma típica da Síndrome de Rokitansky, que têm ovários normais, são: “a fertilização in vitro com a transferência de embriões para o útero de outra mulher ou, mais recentemente e ainda em caráter experimental, o transplante de útero”.

Tratamento

Embora não haja consenso sobre o momento ideal para a criação cirúrgica ou não de uma neovagina funcional, segundo Bárbara, é possível oferecer as condições para que exista vida sexual normal e saudável ao planejar o tratamento de forma individualizada, caso a caso.

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“O tratamento costuma ser bastante eficiente do ponto de vista anatômico e da função sexual, mas é muito importante que a mulher participe ativamente dele, tomando decisões conscientes”, pontua Paulo.

  • Dilatação natural

Indicada principalmente para mulheres que têm parceiro fixo, o canal vaginal vai se expandido de forma gradativa e natural.

“Embora seja uma possibilidade, ter relações para tentar dilatar pode gerar traumas físicos e emocionais, já que não é possível controlar suas condições. Vale lembrar que o sexo deve ser para o prazer e não fonte de tratamento”, diz Bárbara.

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  • Dilatação

Introdução de próteses metálicas ou de silicone que moldam progressivamente os músculos da vagina e esticam o canal vaginal. O uso de dilatadores traz menos riscos, há diversos tamanhos e devem ser usados pela paciente sob supervisão médica por aproximadamente seis meses.

“O tratamento não-cirúrgico com autodilatação atinge mais de 80% de sucesso, e a satisfação da paciente, envolvendo a capacidade de ter relações sexuais, a aceitação vaginal do maior dilatador sem desconforto ou um comprimento vaginal de 7 cm”, afirma Bárbara.

  • Cirurgia

Recomendado para casos mais severos, o procedimento, que dura cerca de uma hora, constrói o canal vaginal com enxertos e é preciso usar por até um ano um molde que garanta que ele não se feche.

“A cirurgia corretiva pode ser indicada se a terapia não-cirúrgica falhar ou se, após aconselhamento, a paciente tomar esta decisão. As opções são a vaginoplastia, mais comum e com alta taxa de sucesso (92%); e a laparoscópica, que, apesar de menos invasiva, ainda precisa de mais dados sobre resultados a longo prazo”, diz Bárbara.

 

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